Quem é de Lavras se lembra do meu galgo Peñarol
                                          
Baio, brasino, bragado, olhos gateados de sol
                                         
Quando meu galgo arrancava com o lombo que era um anzol
             
Bicho que fizesse rastro saía do campo vasto
           
Pro dente do Peñarol
                                      
Me regalou Gim Pinheiro de lá de Tacuarembó
                                         
Era um filhote franzino, magrinho que dava dó
                               
Quem ia dizer que aquilo fosse empurrar mocotó
               
Ganhar dezoito carreiras e os galgos desta fronteira
             
Entupir os olhos de pó
                                       
Lebrinha de pêlo fino, sorrito do pêlo grosso
                                          
Depois de ele botar o olho não tinha muito retoço
                                            
Cruzava dos outros galgos que nem dos cachorros "grosso"
                                         
Quadrava o corpo pra o lado, cortava de atravessado
                   
E juntava atrás do pescoço
                                              
Um dia o Cássio Bonotto, proseando e tomando um trago
                                               
Me contou de um sorro baio que havia lá por Santiago
                                 
Corria mais que os cachorros, vivia fazendo estrago
                
De tanto comer cordeiro já nem botavam carneiro
             
Nas ovelhas deste pago
                                           
Eu disse pra este amigo: mês que vem vou na tua casa
                                                  
Me espera com uma de vinho e um chibo em cima da brasa
                               
O Peñarol vai na piola porque ele não perde vaza
                   
Te garanto que o tal sorro pra escapar do meu cachorro
                   
Só que entoque ou crie asa
                                          
Cheguei no dia marcado, tinha gente até de farda
                                        
Nunca vi tanto gaúcho, nunca vi tanta espingarda
                                     
Diziam: o sorro é bruxo cruzado com onça parda
                                      
Eu disse: deixem comigo! Quem tem medo do perigo
                
Que espere na retaguarda
                                            
Quando batemos no rastro vi que o bicho era escolado
                                             
Fez que ia pra coxilha e respingou rumo ao banhado
                                 
Meteu o dente num galgo, depois cruzou no costado
             
Com a cuscada na escolta gambeteava e dava volta
            
Parecia enfeitiçado
                                        
Eu dei cancha pro meu galgo que saiu erguendo pó
                                           
Porque no fim do banhado era um capão de timbó
                                    
Tinha que alcançar o maleva antes deste cafundó
                        
E eu também larguei com tudo num lobuno topetudo
              
Que era marca da Itaó
                                      
De fato o sorro corria como pouco sorro faz
                                      
Mas peão só se governa onde não tem capataz
                                        
Em seguida meu cachorro fez ele virar pra trás
                                        
E desceram sanga abaixo, "cosa" de macho com macho
              
Trançando dente no más
                                           
Foi quando eu ouvi um tiro vindo de lá do sangão
                                              
Estouro de arma de chumbo de um louco sem precaução
                                
Apeei por cima do toso pra dar fé da situação
                 
Meu galgo tava sangrando mas continuava peleando
          
Baleado no coração
                                               
Agarrou o sorro "das goélas" e apertou contra o capim
                                          
Pra dar fim naquela lida antes da vida ter fim
                                        
Depois "periga" a verdade, mas juro que foi assim
                                     
Deitou por cima do sorro, gruniu pedindo socorro
               
E morreu olhando pra mim
                                      
Enterrei ele no campo florido de maria mol
                                              
Se foi meu galgo bragado do lombo que era um anzol
                                    
Lembro dele com tristeza quando sangra o pôr-do-sol
                  
O causo vem pra memória e a saudade conta a história
           
Do meu galgo Peñarol!